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Holocausto Brasileiro: uma história que ultrapassa os limites do palatável

  • Foto do escritor: Andre Barbeiro
    Andre Barbeiro
  • 11 de jul. de 2022
  • 3 min de leitura

Autora recebeu o prêmio de 'Melhor Livro-Reportagem do Ano de 2013', pela Associação Paulista de Críticos de Arte, com essa produção literária



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Crédito: Reprodução/Luiz Alfredo/Revista O Cruzeiro/Livro Holocausto Brasileiro

Autora de Todo dia a mesma noite e Arrastados, Daniela Arbex, de 50 anos, foi premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte por seu best-seller Holocausto Brasileiro como “Melhor Livro-Reportagem do Ano de 2013”. A produção mostra a real e perversa realidade dos ditos “loucos”, a autora conta a história de pessoas como Antônio Gomes da Silva, Sônia Maria da Costa e Elza Maria do Carmo, que viveram dias tenebrosos e malditos dentro dos portões do Colônia.


Para garantir que o leitor visualize esta realidade, a autora utiliza recursos, como: os relatos das próprias vítimas, fotografias de jornalistas que visitaram o lugar, documentos do hospital e mais uma série de informações e fontes para contar a trágica história de um dos maiores hospícios do Brasil. Lugar que era considerado por muitos um lixão para humanos.


No Colônia, as pessoas eram torturadas, agredidas e menosprezadas. Sueli Rezende é um exemplo disso, ela foi submetida a beber a própria urina para matar a sede, se empilhar para tentar não morrer no frio, comer ratos para não sucumbir à fome e ainda enfrentava diversas sessões de eletrochoque como punição por seu comportamento, que não era tido como apropriado.


Essa, que parece uma história escrita para roteiros de novelas da Globo, foi a verdade de muitas pessoas que, assim como Sueli, não tinham outra opção se não se submeter a essas humilhações para sobreviver.


A produção literária trata de forma empática os tristes relatos das vítimas, além de explorar a visão de ex-funcionários que se incomodavam com as atrocidades do campo de concentração brasileiro, mas que nunca tiveram coragem de desobedecer as ordens dos reais loucos daquele lugar e ajudar quem sofria, por medo de retaliação. Daniela conta, por exemplo, sobre a vida de Geralda Siqueira Santiago, que foi estuprada por seu patrão e engaiolada no Colônia para que ninguém descobrisse sobre a criança.


Segundo Arbex, crianças quietas ou travessas demais eram aprisionadas. Assim como foi o caso do filho de Ana Pereira de Oliveira, uma pobre mãe de Grão Mogol – município de Minas Gerais -, que mandou seu filho, Luiz Pereira de Melo, embarcar no “trem de doido” – como ficou conhecido o transporte ferroviário que levava os pacientes ao hospício -, com o único objetivo de ajudá-lo a “melhorar”, já que era um garoto introvertido.


O livro revela que a mulher esperou a cada dia a volta do amado filho, que nunca teve como destino a casa dele e não pode ver a mãe novamente. Anos depois, ele e a irmã se reencontraram e, apesar dos muitos anos passados, se reconheceram, se abraçaram e choraram.


O Hospital Colônia de Barbacena foi fundado em 12 de outubro de 1903, na cidade de Barbacena, em Minas Gerais, município que ficaria conhecido como “Cidade dos loucos”. Teve como verdade a superlotação até 1930, – um espaço projetado para 200 pessoas agrupava 5 mil. Como alternativa das camas, usavam capim para poder alojar cada vez mais “pacientes”. Descabida, mas considerada inteligente, essa alternativa, inclusive, foi recomendada pelo Poder Público para outros hospitais do estado em 1959. Em 2013, dos 5 mil, restaram apenas 200 sobreviventes.


Daniela Arbex traz à tona uma triste verdade do Brasil. Mostra, com uma angustiante e muito bem construída narrativa, o destino torpe dos desafetos, homossexuais, militantes políticos, mães solteiras, alcoolistas, mendigos, negros, pobres, pessoas sem documentos e todo tipo de indesejado. Este é um livro que deveria ser obrigatório em escolas de ensino médio, já que mostra uma das verdades vividas por humanos durante mais de um século no Brasil.


Uma história que ultrapassa os limites do tolerante, do aceitável e do normal. Uma história que, se contada por Machado de Assis ou Guimarães Rosa, seria considerada ficção. Uma história que acreditamos ver apenas nas produções audiovisuais, porque entendemos ser irreal. Essa é a história do Colônia, um manicômio de Barbacena que desumanizou todos aqueles que eram considerados escória, que se sustentou com o dinheiro do governo enquanto torturava seus pacientes sãos, que deixavam seu estado pleno e se tornavam loucos aos poucos. Essa é a história de um campo de concentração sustentado pelos impostos. Esse é o Holocausto Brasileiro.

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